Foto de pessoas em baixo de um pano gigante.

O Instituto Alana ao lado de outras organizações da sociedade civil assinou o manifesto de repúdio à nota da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) sobre o protesto dos estudantes secundaristas no dia 9 de dezembro. O Instituto Alana também assinou o manifesto que repudia a atual proposta do Governo do Estado de São Paulo de reorganizar a rede estadual de ensino.

Leia o manifesto na íntegra:

MANIFESTO DE REPÚDIO À NOTA DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA SOBRE O PROTESTO DOS ESTUDANTES SECUNDARISTAS

Diante do envio de uma Nota à Imprensa pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP) 1 , no dia 10 de dezembro de 2015, com o objetivo evidente de criminalizar, desmoralizar e intimidar os apoiadores e estudantes secundaristas do protesto organizado por esses, na noite do dia 09 de dezembro, as organizações, coletivos e pessoas que subscrevem esse manifesto vem publicamente repudiar a Nota da SSP e denunciar a sistemática violação aos direitos humanos que tem sido cometida pela Policia Militar de São Paulo contra os estudantes secundaristas e seus apoiadores nas últimas semanas.

É absolutamente inaceitável que 27 anos após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a qual veio para garantir a plena liberdade de expressão, direito à manifestação, direito de reunião e direitos políticos básicos, um órgão público do Estado abuse de sua autoridade para intimidar e criminalizar cidadãos ao apontar em sua nota que manifestantes de “partidos políticos”, da APEOESP e com camiseta da “Juventude Comunista” seriam grupos com “clara motivação política e criminosa”.

Isso quer dizer que ter uma opção politico-ideológica ou apoiar manifestações por um ensino de qualidade nas escolas publicas é crime? É essa a Guerra do governador, que segue na estratégia de desmoralizar para desorganizar o movimento secundarista? Vale lembrar que tal declaração vem em um contexto em que diversas ações violentas do aparato do Estado de São Paulo, amplamente noticiadas pela mídia, tem sido praticadas pela polícia contra os estudantes, com o único fim de desmobilizar sua organização. Tal perseguição politicoideológica remete aos tempos da Ditadura civil-militar (1964-1985) e DEVE SER ABOLIDA de um sistema supostamente democrático.

Necessário esclarecer e tornar público que estamos diante de parte estratégica do plano de Guerra de Informações anunciada pelo Governo do Estado, em áudio vazado de dentro da Secretaria de Educação, contra a luta dos estudantes, tratados como “inimigos” a serem desmoralizados, desmobilizados, abatidos. Durante o protesto do dia 09 de dezembro houve um total de 10 detidos e inúmeros feridos por socos, estilhaços de bomba da PM, spray de pimenta, cassetete, havendo inclusive relato de um jornalista segundo o qual a PM disferiu tiros de arma de fogo para o alto, causando pânico nas pessoas ao redor.

Nos boletins de ocorrência constam apenas as acusações feitas pelos policiais militares, os depoimentos das testemunhas e os interrogatórios dos detidos foram propositalmente ignorados nos BO’s. As acusações são por supostos crimes de desobediência e desacato. A desobediência foi imputada a estudantes que corriam das bombas atiradas pela polícia e apoiadores que apenas estavam voltando para suas casas. A arbitrariedade é clara.

Não por acaso, as acusações por desobediência e desacato são típicas de regimes ditatoriais em que a única prova é a palavra do policial que abusa de sua autoridade para intimidar e prender, mesmo quando há vídeos e testemunhas que comprovam não ter havido crime algum, como foi o caso dos 10 detidos na noite da manifestação. Pura intimidação policialesca contra um direito constitucional dos estudantes, o direito de lutar pelo direito à educação. O Brasil é um dos últimos países que seguem prevendo desacato como crime, situação já repudiada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ONU, por ser um atentado à liberdade de expressão. É necessário denunciar que o Estado se vale da figura do crime de desacato para inviabilizar o direito dos estudantes de se manifestar. Isso tudo se agrava no atual contexto, no qual desde o dia 1/12, a imputação de tal delito vem sendo utilizada para legitimar apreensões absolutamente ilegais – as abomináveis prisões para averiguação de adolescentes nos protestos, com relatos de agressões físicas e ameaças, relatos estes com acompanhamento realizado pelo Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.

Além de repudiar especificamente as acusações infundadas da Secretaria de Segurança Pública, que caem por terra pelos boletins de ocorrências lavrados por seus próprios órgãos, os quais não registraram crimes de dano ao patrimônio público ou crimes de lesão corporal contra os estudantes detidos, também se repudia aqui a recorrente violência policial e cometimento de arbitrariedades para reprimir o direito de protesto que já foram objeto de denúncia internacional (3) . Esse cenário ressalta o quanto o suposto Estado Democrático de Direito em que vivemos se mostra como um Estado de Exceção permanente contra aqueles que se dispõe a exercer a luta por direitos. A Secretaria de Segurança Pública assume postura pública típica do período de Ditadura Civil-Militar (4) , criticada até mesmo pela própria Ouvidoria da Polícia do Estado de São Paulo5 .

Existe um projeto político claro em andamento de combate ao “inimigo interno” da (in)segurança pública, a bola da vez, os estudantes como a caracterização atual do povo tratado como questão de polícia, os estudantes como os novos “inimigos do Estado”. Esse modelo de (in)segurança pública é herdado de uma construção histórica de repressão aos movimentos populares, desde “Canudos”, passando pelos operários grevistas e chegando hoje à resistência dos estudantes secundaristas: a questão social continua sendo caso de polícia. Cada passo contra as arbitrariedades e ilegalidades do Estado é importante para combater esse cenário de violações constantes e sistemáticas aos direitos humanos. Só assim seguiremos avançando no aprofundamento das conquistas das lutas sociais, contra as quais a repressão policial e do Estado voltam sua nova estratégia de Guerra de Informações: reprimir com a força, de um lado, desmoralizar com contrainformações, por outro, visando desmobilizar os estudantes em luta. A luta destes, porém, segue como grande educadora e norte para o futuro. Os estudantes, hoje, dão a melhor aula de democracia.

Assinam esse Manifesto:

GAS – GRUPO AUTÔNOMO DE SECUNDARISTAS

COMITÊ MÃES E PAIS EM LUTA

AÇÃO EDUCATIVA

AMPARAR – ASSOCIAÇÃO DE AMIGOS E FAMILIARES DE PRESOS/AS

APG – USP/CAPITAL – ASSOCIAÇÃO DE PÓS-GRADUAND@S HELENIRA “PRETA” REZENDE

APROPUC – ASSOCIAÇÃO DE PROFESSORES DA PUC-SP

ARTIGO 19

ASBRAD – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DEFESA DA MULHER DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE

ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO – ASDPESP

CAF – CENTRO ACADÊMICO DE FILOSOFIA DA USP

CDHS – CENTRO DE DIREITOS HUMANOS SAPOPEMBA

CEDECA/DF – CENTRO DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DO DF

CENTRO DE ASSESSORIA POPULAR MARIANA CRIOLA

CENTRO DE MÍDIA INDEPENDENTE – CMI-SP

CENTRO GASPAR GARCIA DE DIREITOS HUMANOS

COLETIVO DE GALOCHAS

COLETIVO MALUNGO

COMBOIO

COMITÊ PELA DESMILITARIZAÇÃO DA POLÍCIA E DA POLÍTICA – SP

CONECTAS DIREITOS HUMANOS

CPECC – CENTRO DE PESQUISA E EXTENSÃO EM CIÊNCIAS CRIMINAIS

CRESS/SP – CONSELHO REGIONAL DE SERVIÇO SOCIAL DE SP

DAR – COLETIVO DESENTORPECENDO A RAZÃO

DEPARTAMENTO JURÍDICO XI DE AGOSTO

EMANCIPA

FRENTE CHEGA DE ASSÉDIO

GRUPO PARLENDAS

IBCCRIM – INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS

INSTITUTO ALANA

INSTITUTO PRÁXIS DE DIREITOS HUMANOS

INTERVOZES

ITTC – INSTITUTO TERRA, TRABALHO E CIDADANIA

JUNTOS

JUSTIÇA GLOBAL

KIWI COMPANHIA DE TEATRO

LABORATÓRIO PSICANÁLISE E SOCIEDADE – INSTITUTO DE PSICOLOGIA DA USP

MÃES DE MAIO

MÃES DO CÁRCERE

MAL EDUCADO

MARGENS CLÍNICAS

MMM – MARCHA MUNDIAL DE MULHERES

MOVIMENTO PASSE LIVRE – MPL-SP

NÚCLEO DE DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA DE MARÍLIA – NUDHUC/UNESP

NÚCLEO DE ESTUDOS E PESQUISA PSICANÁLISE E POLÍTICA – FACULDADE DE PSICOLOGIA DA PUC-SP

NÚCLEO ESPECIALIZADO DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO – NCDH

NÚCLEO ESPECIALIZADO DE INFÂNCIA E JUVENTUDE DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO – NEIJ

NÚCLEO ESPECIALIZADO DE SITUAÇÃO CARCERÁRIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO – NESC

OUVIDORIA DA DEFENSORIA PÚBLICA DE SÃO PAULO

PASTORAL CARCERÁRIA NACIONAL

PROMOTORAS LEGAIS POPULARES

REDE 02 DE OUTUBRO

REDE NACIONAL DE ADVOGADAS E ADVOGADOS POPULARES – RENAP

TRIBUNAL POPULAR

UNIÃO DE MULHERES DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO

Para subscrever esse Manifesto, envie um e-mail com os dados para: repudiossp@gmail.com

1 http://www.ssp.sp.gov.br/noticia/lenoticia.aspx?id=366210

2 https://www.youtube.com/watch?v=df7bfofQuE8&feature=youtu.be

3 http://oglobo.globo.com/brasil/brasil-acusado-na-oea-de-violar-direitos-humanos-em-protestos- 12016170

4 http://brasil.elpais.com/brasil/2015/12/03/politica/1449172759_306162.html

5 http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2015/12/ouvidor-das-policias-diz-que-pm-foi-truculenta-aodesocupar-escolas-e-vias.htm

Foto: Agência Brasil