Foto em preto e branco de criança segurando um megafone

Em 23 de setembro, 16 adolescentes de doze países apresentaram uma denúncia contra Brasil, Argentina, França, Alemanha e Turquia para o Comitê sobre os Direitos das Crianças da Organização das Nações Unidas (ONU). A ação aponta que os cinco países estão se omitindo ou deliberadamente agindo de modo contrário ao que se comprometeram a fazer para frear as mudanças climáticas no Acordo de Paris. Com isso, as nações violam a Convenção sobre os Direitos das Crianças, que garante o direito à vida, à saúde e à cultura, por exemplo. É a primeira vez que crianças fazem uma denúncia dessa natureza na ONU.

Foto da coletiva de imprensa com os dezesseis jovens que entregaram denúncia na ONU

Coletiva de imprensa com os 16 ativistas | Foto: Radhika Chalasani/Unicef

Catarina Lorenzo, de 12 anos, é a representante brasileira do grupo. Ela é surfista, mora em Salvador e conversou conosco por Whatsapp, direto de Nova York, onde participa de uma série de atividades em razão da entrega da denúncia. Dona de uma voz potente, com notas de indignação, a jovem ativista falou sobre mudanças climáticas e a importância de se considerar e ouvir a voz de crianças e adolescentes no tema.

“Meu pai é surfista. Quando eu tinha dois anos, ele me colocou na minha primeira onda e eu fiquei em pé, sozinha! Desde então, sempre tive uma conexão muito forte com o oceano. Uma vez,  eu estava nadando numa piscina natural, e reparei que o coral estava cheio de pontos brancos. Cheguei bem perto, vi que estava sem alga nenhuma e a água estava muito quente. Eu mergulhei e toquei na areia. Geralmente, quando eu faço isso, a água vai esfriando; mas dessa vez ela continuou muito quente. Tão quente que eu tive que sair, não aguentei. Daí eu pensei: se eu não aguento, como os peixes, corais e animais marinhos aguentariam ficar? Aquele coral estava morrendo”. Esse, conta Catarina, foi um dos grandes momentos de alerta para o efeito das mudanças climáticas em seu dia a dia, desde então o assunto ganhou outra proporção. 

A saúde do planeta sempre foi uma preocupação da família, o ativismo no tema é “desde pequena, por parte de pai e de mãe”, diz. ” A gente foi pra rua protestar quando queriam passar uma avenida no meio do Vale Encantado”. Catarina e Caroline, sua mãe, participam ativamente do movimento SOS Vale Encantado, iniciativa de voluntários para proteger a área de 100 hectares de remanescentes da Mata Atlântica em Salvador.

Foto de Catarina Lorenzo durante coletiva de imprensa com os dezesseis jovens que entregaram denúncia na ONU

Catarina Lorenzo durante coletiva de imprensa na ONU | Foto: Radhika Chalasani/Unicef

Ela conta que, na escola, teve aulas sobre Ciências do Meio Ambiente, aprendeu bastante sobre mudanças climáticas e começou a se interessar muito mais pelo assunto. “As ações dos adultos começaram a causar esse problema no passado e eles continuam fazendo as mesmas coisas. Nós temos que ser ouvidos! São as crianças que sofrerão as consequências: problemas para respirar, não vamos poder tomar banho de rio e de mar, plantar e colher comida, não vamos ter água, perder nossas casas. Nós vamos pagar pelas consequências dos atos dos adultos”, explica.

“Parece que querem ajudar as mudanças climáticas em vez de pensar no planeta Terra”, lamenta ao contar a história da canalização do Rio Jaguaribe, em Salvador. “Eles canalizaram, viraram as costas pra gente e jogam esgoto no oceano”. Muitas vezes, ela não pode ir surfar, em razão da concentração de esgoto na praia.

Sobre a atuação dos governos, Catarina diz que gostaria que se levasse em conta os impactos sentidos por crianças e adolescentes em todas as ações, tivessem responsabilidade e entendessem que “as atitudes deles têm efeito direto nas mudanças climáticas. Gostaria, também, que ensinassem mais sobre esse tema nas escolas e que protegessem e plantassem mais árvores. Porque a árvore é tipo uma máquina sugadora de gás carbônico do ar. Então, quanto mais árvores a gente tiver, menos gás carbônico teremos no ar”.

“Os adultos criaram o problema e, pelo visto, são poucos os que estão do nosso lado. Já que eles não vão fazer nada, nós, crianças e adolescentes, temos que atuar já! Assim como os adultos tiveram oportunidade de ter e pensar em um futuro, nós também queremos ter direito ao futuro”, complementa a ativista.

 

 

 

*Texto também publicado no Portal Lunetas