Estudo divulgado hoje, 23, pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) revela como as medidas de austeridade fiscal e a aprovação da Emenda Constitucional 95 reduziram as políticas sociais necessárias para proteger a população mais vulnerável da atual pandemia. Intitulado O Brasil com baixa imunidade – Balanço do Orçamentário Geral da União 2019, o relatório mostra que, de 2014 até 2019, o constante esforço fiscal da União resultou em cortes de 28,9% nas despesas discricionárias dos programas sociais do país. Só no período entre 2018 e 2019, a queda de orçamento nas áreas sociais chegou a 8,6%.
O orçamento de 2019 para a saúde, que sofre uma histórica insuficiência de recursos no Sistema Único de Saúde (SUS), ficou no patamar do investido em 2014. Por outro lado, a população brasileira aumentou em 7 milhões de habitantes nesse período, o que revela uma grave redução das despesas per capita. Além da saúde, a publicação avaliou a execução, em 2019, do orçamento da União em outros sete conjuntos de políticas públicas: educação, direito à cidade, socioambiental, criança e adolescente, igualdade racial, mulheres e povos indígenas.
“Para além de uma análise fria dos números, buscamos saber se as políticas públicas e seus respectivos orçamentos estão a serviço do bem estar das pessoas, principalmente das que mais precisam, e não somente para proteger a dívida pública”, pontua Livia Gerbase, assessora do Inesc.
Com relação às políticas voltadas para crianças e adolescentes, o relatório aponta, além de queda expressiva dos recursos alocados entre 2012 e 2016, uma execução orçamentária muito baixa. O valor autorizado em 2012, por exemplo, caiu de pouco mais de R$ 730 milhões para cerca de R$ 55 milhões em 2016. O valor executado (pago) passou de R$ 447 milhões em 2012 para R$ 3 milhões em 2016. “A conclusão é que abandona-se a prioridade em relação às políticas da infância e adolescência entre 2014 e 2016, sendo que em 2016 o gasto foi irrisório, e quando o recurso começa a entrar novamente, em 2017, é voltado para um recorte etário específico, a primeira infância, deixando as outras áreas desatendidas”, indica o documento.
Ao analisar as políticas de educação, saúde, do sistema socioeducativo, do combate ao trabalho infantil e à violência, o documento aponta que “a queda da previsão orçamentária no decorrer dos anos fere o princípio da realização progressiva dos direitos. A não execução completa dos recursos autorizados, que já é muito abaixo do necessário, vai na contramão do pilar da mobilização máxima de recursos disponíveis. (…) O pilar da não-discriminação também não vem sendo atendido, uma vez que o governo não garante a universalidade do atendimento a todas às crianças e adolescentes do Brasil, contribuindo para a manutenção das violações que atingem mais fortemente meninas e meninos negras (os), indígenas, LGBTQIA+, moradores das periferias do país e do meio rural, entre outras”, conclui.
Baixe o relatório na íntegra aqui
Austeridade em contexto de pandemia
Em março, organizações da sociedade civil entraram com uma petição no STF pela suspensão imediata da Emenda Constitucional 95. No documento, as organizações alegam que a pandemia chega ao país em um contexto de extrema fragilização das políticas sociais e de aumento da pobreza da população, e que seus efeitos vão ultrapassar 2020.
As entidades enviaram também, na semana passada (17) um comunicado conjunto a relatores da Organização das Nações Unidas (ONU) e a comissionados da Organização dos Estados Americanos (OEA), chamando atenção para o risco de manter em vigor a EC95 no contexto da pandemia. O documento apresenta detalhes sobre os problemas causados pela emenda e solicita que relatores recomendem ao Brasil a sua revogação.